segunda-feira, 18 de dezembro de 2006


desconheça-me, amor imenso
pois meu céu esqueceu o azul
nas primeiras rachaduras do pôr-do-sol
e eu tenho a alma
DESESPERADAMENTE
carcomida por cores mortas.

sábado, 9 de dezembro de 2006


escapa-me!
o que sinto destrói
e minha língua é feita de paisagens
áridas, limpas e infecciosas:
meus sonhos rumam para nunca serem.

esqueça-me!
por não ter descoberto
a ternura do teu silêncio
meu legado é pesaroso:
pertenço ao que fica pra trás.

segunda-feira, 27 de novembro de 2006

pra marianna,
numa madrugada amputada de mim.



(Há um grito preso na minha garganta. Tem as cores do teu nome, ele disse. Bifurca meu horizonte sem apontar uma direção. Sou um homem só, foram suas últimas palavras antes de vê-la afastar-se lentamente, caminhando com a leveza de quem se despe de um fardo por demais datado. Ela, a menina que amanhecia seus girassóis, partindo. Como se a vida fosse uma peça barata a ser encenada exaustivamente, aquele homem, de mãos suaves e delirantes, repetia diante do espelho: a felicidade é um momento crível, por deus, tem que ser! Inútil. Não conseguia convencer a si mesmo de que tudo voltaria a ser como no início, quando as manhãs respiravam sorrisos e os olhos daquela menina eram só os olhos da menina que ele tanto amava, e não aqueles rastros de nada que agora assombrariam um futuro não visto, futuro de um homem qualquer. Sem compaixão, sem esperança, a vida tropeça naqueles que não sabem dançar)



é teu o adeus...
comigo, o que ficou retido
nas entranhas dessa recusa
desesperada e muda
como se amor não pudesse
um dia acordar mais cedo
para morrer sem livrar-nos
do fantasma de nós dois.

sábado, 18 de novembro de 2006


ponto inalcançável
quando marcas extraem
de ti reticências
(amor assim parece)

erro prescrito
quando promessas impõem
a ti congruências
(amor assim padece)

sábado, 4 de novembro de 2006


faz silêncio por aqui
o que torna o quarto impregnado
dessa lembrança de você
engasgada nos meus rastros
arquivada na luz branca
refletida sobre as palavras
escritas nuas em mim

segunda-feira, 23 de outubro de 2006

as roupas
guardam você
na ausência
no adeus
na morte

vestem você
de medo
de pesares
de angústia

despem você
de sonhos
de esperança
de amanhãs

(avessas ao tempo
,imunes às palavras
,dizem apenas
o que precisam dizer)

sexta-feira, 13 de outubro de 2006


pro Celso, antes dum amanhecer.


amor-comprimido
tiros de festim ecoando
sob a benevolência
duma manhã que não chega
e nem sai daqui
(minha esperança malsã)

nossos corpos são restos de medo
nossas preces são vidas prescritas
sabemos bem qual o nosso lugar
e por lá ficamos quietos
perpendicularmente a sós
(lucidez amargurada e vã)

quinta-feira, 5 de outubro de 2006


redon
madrugada,
apenas outra madrugada
acobertando palavras
engasgadas na alma
tiquetaqueando o medo
fingidor de quem sou

(perdoa-me por não ter
de deus escapado aos afagos
e buscado a esperança
nos jardins da minha infância:
eu não soube alcançar os abismos teus)

madrugada,
e o peso de outra manhã
a aproximar-se daqui
inevitavelmente lúcida e conhecedora
de mim os demônios irascíveis


(escavo velhos refúgios
pedaços desertos de fé
para que eu possa saltitar sobre a dor
antes que o sol de ti revele as sobras:
eu não pude enfrentar os caminhos meus)

segunda-feira, 25 de setembro de 2006


a casa
vazia de esperança
escondia restos de sorrisos
em caixinhas de fósforos
e gavetas empoeiradas
como se assim fosse possível
estrangular o peso da morte
que a vida sabe impor

quarta-feira, 13 de setembro de 2006



há paisagens se desfazendo diante de nós. ruidosa, a cidade escoa o excedente, as sobras desta primavera anunciada com entusiasmo. bobagem! estou diante de fatos: teu amor embruteceu e eu sinto-me velho para acreditar nisso de esperanças renovadas. eu sei das cores que a nova estação trará e aceito teus argumentos, todos, mas não aprendi a calar meu desconforto. uma questão de sobrevivência, escuta: é preciso abortar-nos por completo para que a nossa vida escape desse desmoronamento. amanhã, espero não estares ao meu lado. até lá, vou fingindo que tudo está bem. este é o custo de anos e anos de convivência, respeito, rotina e ilusões. infelizmente, só descobrimos agora. e já é tarde, tarde demais.

sexta-feira, 25 de agosto de 2006


é feito dor
que escrevo
poemas embravecidos
fustigados pelo tempo
circunscrito na palma das mãos
do pálido aceno
que te levou daqui
mas não me deixou
a solidão
(carros, pessoas, livros,cigarros, canções
só aumentam a brevidade incômoda
desse amor que passou
d
e
s
a
b
a
n
d
o
a certeza de mim)

sábado, 19 de agosto de 2006

desfaz-te
ilusão suspensa entre a brancura das nuvens
e o peso esquecido das folhas de papel
entulhadas na gaveta da escrivaninha
desse quarto
onde passas horas
e horas
e horas
rabiscando frágeis poesias
perdido da infância
abraçado à saudade
que perfura os ossos
que corrói a certeza
TORNIQUETE
apertando-te o coração e as palavras
esparsas imagens diante do rosto
envelhecido
cansado
medroso
desse homem
fazedor de invisíveis mundos
onde só um pode habitar

quarta-feira, 9 de agosto de 2006

yolanda velazquez
CANÇÃO GUARDANDO AURORAS

as horas marcavam
aquilo que inexistia
longe de ti

– foi o vento que trouxe
teu nome de volta
escrevendo outro destino
nas páginas vazias
das minhas canções –

segunda-feira, 31 de julho de 2006

escape
não fuja
tranque todos os sonhos
nas gavetas
lapide frases e descreva
diante do espelho
quem és
&
mesmo que seja pouco
detalhe aquilo que não houve
após a mudez da mentira
ter cobrado o preço
- eis a felicidade -
(apenas fragmentos importam
se tudo o que alcanças
são fracassos)

quarta-feira, 12 de julho de 2006



pro syd
não foi a morte
não
nem as vozes que cutucavam
a tua cabeça
nem a lua, escura e desatenta
de ti

não foi a morte
não
nem o teu silêncio aprisionado
no peito
nem as manhãs, frias e esqueléticas
sem ti

[os anjos sabem teu nome]

domingo, 2 de julho de 2006


a solidão por vezes estrangula
– quando deixamos de ser companhia –
a solidão não duvida nem titubeia

– olha direto nos olhos –
a solidão tem dedos magros e longos

– sabe onde a nossa dor está escondida –
[fiel, repousa em silêncio no lado de dentro da esperança]

sábado, 17 de junho de 2006


limpo de toda palavra
minha descida é nula

espécie de medo
preso entre os dentes

um sol envasilhado & estrelas
envelhecidas pela arritmia

dos meus pés descalços
sem chão para sonhar

domingo, 11 de junho de 2006


tecendo incoerência
preso neste emaranhado de tristeza
eu abdico do calar
ESTACIONANDO NAS FOTOGRAFIAS ENVELHECIDAS
redefino o verbo
recapitulo a dor
acendo velas ao que partiu
sonho sozinho
mesmo não tendo o que sonhar

[fotos guardam dias e noites
sem estrelas sem lua sem sol]

quarta-feira, 24 de maio de 2006


Pequenos homens
de olhos vazados pela luz
e sorrisos amarelecidos pelo desuso
– voltam, sempre –
E trazem na carne o medo
a aprisionar aquilo que nunca terão.

segunda-feira, 1 de maio de 2006


era pra guardar num velho baú
era pra acomodar nas gavetas
era pra deixar quieto num canto
era pra ser apenas memória
era pra ser comum
era pra ser medroso

mas
não era
amor isso tudo?

quinta-feira, 27 de abril de 2006


As vozes
Não saem
Da minha cabeça

As vozes
Não cabem
Na minha cabeça

As vozes
Não pertencem
À minha cabeça
As vozes
Não sabem
As vozes
Não ouvem
As vozes
Não deixam
As vozes
Não


As vozes

A minha cabeça

terça-feira, 4 de abril de 2006

Wayne Forte
O espaço entre os músculos e a inquietação da alma
[novo ponto a ser sufocado]
Retrato absoluto de outra tarde desolada.

Minúsculo rizoma
onde o cinza prevalece – céu anunciando mudança climática.


A lua crescente é o que te parece mais lúcido
[velhos amigos envoltos em trapos]
Longe, as memórias acenam horizontes estanques.

Amórfico entardecer onde o azul rareia
– trinta e oito anos delimitados pela dor –


No one knows and no one came
No one knows and no one came
No one knows and no one came

Be my preferred angel
Be my preferred friend
Be my preferred true
– flesh and blood
of mine –

O que secretas te desnuda a essência
O que permites disfarça toda ausência
Quando aquietas é que te nutrem as esperanças.

Eat my sins
Redemption is here
Redemption is here
Redemption is here
Always here


No medo encontras aquilo que te imuniza
O que te falta quando a queda parece lampejo
Quando a ilusão não passa de um sorriso perdido


As entranhas ardem em desespero
As entranhas ardem em desespero

Entranhas
Desespero

segunda-feira, 20 de março de 2006



As paredes do quarto
Ganham outras formas e texturas
Quando as cores da primavera ficam mais distantes.

A alma tateia a superfície do medo
E o peso de cada momento redobra
Quando a chuva lá fora varre lembranças.

Nesta agônica cantiga
A crueza do abandono resvala nas horas
Quando a dormência dos indigentes infesta a esperança.

[cai sobre meus ombros o que restou das recordações]

Povoada por sons
A melancolia do poente anoitece a sanidade
Quando a febre em mim persiste.

Um lampejo e sou deus
Um aceno e desfaço ilusões
Um segundo a mais e seria poesia.

domingo, 5 de março de 2006





NOTAS ESPARSAS D’UMA MANHÃ SEM SOL
Haveria de ser algo que destroçasse
Nenhuma palavra poderia escapar
Dos nossos corpos suados e sós
Largados na cama como sobras
Disfarçando o amor até a medula
Na cômica cadência moribunda de cada dia

Haveria de ser algo que rasgasse
Nenhum sentimento poderia saber
Dos nossos mudos dissabores e nós
Amedrontados nos ossos sem fé
Cuspindo nas almas o escárnio
Na trágica dormência dos desejos descumpridos.

sábado, 25 de fevereiro de 2006




A solidão nos abraça, sempre
[para nos sufocar, deixa preso em nosso peito o azul-grito;
para nos acalentar, traz de volta à nossa infância o branco-alvorada]
A solidão nos olha por dentro, sempre
[sabe daquilo que enterraremos conosco, silêncio;
sabe daquilo que nos impediram calar, medo]
A solidão nos acompanha, sempre
[pelas tardes que nos escapam poentes, angústia;
pelas madrugadas que nos invadem famintas, demência]

domingo, 12 de fevereiro de 2006


A nuca estava nua – era a lua longe daquilo que eu com dificuldade respirava
[respingos da tua passagem mantendo a vida acesa
e a vida só dura enquanto nos é possível sonhar]


Não mais haveria outra imagem naquelas retinas esquecidas pelo descarrilar do tempo
[amarguras travam a circulação dos sonhos
e os sonhos adoecem quando cabem na palma das mãos]

terça-feira, 7 de fevereiro de 2006


Você não tem uma palavra
que sele meus sonhos
e me faça adormecer
quando a madrugada
trouxer a solidão?

[nunca soube do sol as trilhas que partem pra lugar algum,
feitas de silêncio e grama com cheiro de infância]

Você não virá dizer
que conhece a saída
pra dor que esfacela
as reminiscências
do azul feito de restos?

[nunca descobriu os segredos da chuva das tardes de Belém,
feitos de jambeiros floridos e pássaros poentes]

Sentiu que era inútil prosseguir
Sentiu que era sofrido amanhecer

As feridas
cauterizadas
Os nós da alma
atados
As linhas do destino
alinhadas
Procurando o fim

E havia sombras, onde reluzira
E escutava-se medo, onde sorrira
E alimentava-se culpa, onde sonhara
E reinava o pesar, onde amara

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2006

Daquilo que se repete incansavelmente dentro da alma

fica o desamor pesando sobre nossos sonhos

restos de sonhos-cobaias


[a sobrevida do instante

o escárnio das auroras infestadas por gafanhotos marrons

a palidez da lua dentro dos teus olhos

a minha pele nervosa e suada

as brancas paredes deste maldito quarto

que não me deixam rabiscar

outro horizonte na boca de deus]


Eu preciso d’um minuto sem ouvir vozes

Eu preciso sangrar o que me adoece

Eu preciso estancar a lucidez

Eu preciso sair daqui

Eu preciso do teu colo

E da tua nudez de menina

Eu preciso que amanheças meus girassóis

Eu preciso que saibas do meu mundo


Recomeçar as estrelas

Reanimar as auroras

Reavivar os sonhos

E de novo, sorrir.

domingo, 29 de janeiro de 2006

nutra-se
dos meus
ossos
eu dou-te
os meus
ossos
todos
e quero
o
azul
dos teus
sonhos
febris.
na minha boca
um universo
onde desfaço
a trilha da morte
para que
a
eternidade
possa brincar
aos teus pés,
descalça
da nudez
distraídados girassóis
.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2006

nas calçadas desta cidade úmida e desmemoriada, o vazio sobrevive cercado por

corpos-sentenças


[cabeças, troncos e membros amontoados numa prostração mordaz, esquecidos no tempo, estagnados ao léu, lambuzados numa estética crua]


nas esquinas desta cidade cravada no meio do rio, o luar cresce limitado por

sombras-cadências


[tateando as horas, admito a exatidão das minhas perdas, subscrevo o lamento do próximo amanhecer e afogo-me nos cantos hipócritas da minha alma]